[Resenha] Canção de Ninar – Leïla Slimani
Sinopse: apesar da relutância do marido, Myriam, mãe
de duas crianças pequenas, decide voltar a trabalhar em um escritório de
advocacia. O casal inicia uma seleção rigorosa em busca da babá perfeita e fica
encantado ao encontrar Louise: discreta, educada e dedicada, ela se dá bem com
as crianças, mantém a casa sempre limpa e não reclama quando precisa ficar até
tarde. Aos poucos, no entanto, a relação de dependência mútua entre a família e
Louise dá origem a pequenas frustrações – até o dia em que ocorre uma tragédia.
Com uma tensão crescente construída desde as primeiras linhas, Canção de ninar
trata de questões que revelam a essência de nossos tempos, abordando as
relações de poder, os preconceitos de classe e entre culturas, o papel da
mulher na sociedade e as cobranças envolvendo a maternidade. Publicado em mais
de 30 países e com mais de 600 mil exemplares vendidos na França, Canção de
ninar fez de Leïla Slimani a primeira autora de origem marroquina a vencer o
Goncourt, o mais prestigioso prêmio literário francês. “A tensão latente em
cada página aquece aos poucos a análise da burguesia, até ser dinamitada por um
impulso de violência instintiva.” Stéphanie Dupays e Eric Loret, Le Monde.
Opinião e análise: “ Canção de Ninar”
Durante o século XV, um conjunto de
práticas econômicas e políticas denominado Mercantilismo entrou em vigor. Foi
nessa época que o fenômeno da Globalização foi instaurado, marcado por um
aprofundamento das relações sociais, econômicas e culturais entre os países e
tendo os seus primeiros passos no momento em que as nações europeias
mercantilistas empreenderam grandes navegações em busca de novas terras e
riquezas em outros países. O fenômeno da Globalização ainda se faz presente nos
dias de hoje e uma de suas manifestações reside nos movimentos migratórios.
Movimentos migratórios constituem um tema
bastante polêmico, o qual suscita várias discussões. No caso da França, ocorre
a explosão de intensos e violentos conflitos envolvendo imigrantes e seus
descendentes na periferia. Durante um bom tempo, a imigração foi vista como uma
solução para a carência de mão-de-obra e para o déficit demográfico no país. Contudo,
após a ascensão de determinados grupos na França, surgiu uma visão partilhada
por uma parcela considerável da população: a de que o país não pode abrigar
todos os seus imigrantes.
É nesse contexto que Leïla Slimani, escritora franco-marroquina, concebe “Canção de Ninar”, uma obra atual que
venceu diversos prêmios. Além da temática dos movimentos migratórios, Leïla problematiza as
exigências dos deveres maternos em meio ao crescimento da participação das
mulheres no mercado de trabalho, as complexidades inerentes ao ser humano e a
influência que todas as circunstâncias em que um crime é cometido exerce sobre
o seu acontecimento. A história tem o seu início a partir do seguinte trecho:
“
O bebê está morto. Bastaram alguns segundos. O médico assegurou que ele não
tinha sofrido. Estenderam-no em uma capa cinza e fecharam o zíper sobre o corpo
articulado que boiava em meio aos brinquedos. A menina, por sua vez, ainda
estava viva quando o socorro chegou. Resistiu como uma fera. Encontraram marcas
de luta, pedaços de pele sobre as unhas molinhas. Na ambulância que a
transportava ao hospital ela estava agitada,tomada por convulsões. Com os olhos
esbugalhados, parecia procurar o ar. Sua garganta estava cheia de sangue. Os
pulmões estavam perfurados e a cabeça tinham batido com violência contra a
cômoda azul. “ (SLIMANI, 2016, p.9)
Quem seriam o bebê morto e a menina que
resiste a falecer? Quem foi o responsável pelo ocorrido? Diante de que
circunstâncias esse incidente veio a tona? Como as pessoas envolvidas se
conheceram?
Essas e outras questões têm as suas respostas
desenvolvidas no decurso da narrativa.
Myriam e Paul são um casal francês que está
à procura de uma babá para os seus filhos, Mila e Adam. Mila é a primeira filha
do casal. Myriam deu Mila à luz duas semanas após se formar no curso de
Direito. Paul era um músico que buscava conseguir grande sucesso com a sua
carreira de produtor musical. Era otimista, e o seu otimismo atraía a admiração
de Myriam.
Mila era um bebê frágil e custava a engordar.
Um ano e meio após o seu nascimento, Myrian engravidou novamente. Adam era o
nome do novo filho que tivera com Paul.
A provisão do lar até então era feita por
Paul, o qual não enfrentava grandes dificuldades para tal. Contudo, apesar de
que durante muito tempo as funções da mulher designadas pela sociedade fossem
restritas a se tornar uma boa mãe e uma boa esposa, Myriam desejava prosperar
na área do Direito, o que para muitos demandaria o empreendimento de
maiores esforços. Como se isso não bastasse, Paul ainda dizia-lhe que o
rendimento financeiro que ela obteria poderia ser similar ao que normalmente se
paga a uma babá.
Assim mesmo, Myriam insistiu em tentar
prosperar no ramo do Direito. Para que pudesse devotar parte de suas energias a
esse objetivo, Myram precisaria de que ela e Paul contratassem uma babá para
cuidar de Mila e Adam durante parte do dia. O casal não poderia encarregar
qualquer pessoa a essa tarefa por motivos de confiança.
Myriam não aceitava que essa função fosse
assumida por um imigrante ilegal. Emma, sua amiga, disse em certa ocasião que
não valia a pena contratar uma babá que já tivesse filhos, pois quando
contratou uma ela não se dedicou inteiramente a seus deveres devido à companhia
de seus dois filhos enquanto trabalhava, os quais dividiam as atenções dela com
as suas incumbências.
Diante dessas circunstâncias, houve
cuidado da parte de Myriam e Paul ao contratar uma babá para seus filhos. Após
a procura, finalmente encontraram Louise. De acordo com os seus antigos
empregadores, Louise desempenhava a função de babá muito bem, sendo considerada
pelos seus filhos como uma segunda mãe. A partir de então, diversas questões
levantadas no início do livro começam a serem respondidas.
A
escrita de Leïla Slimani é bem leve, o que permite ao leitor ler a obra sem se
cansar. Caso eu não estivesse sobrecarregado, certamente teria concluído a
leitura em menos de um dia. Acredito que quem tiver tempo livre à disposição
também leia “Canção de Ninar” nesse intervalo de tempo.
Além da escrita leve, Leïla se vale de outros
recursos para manter o leitor prosseguindo com a leitura da obra. Dentre elas,
cumpre citar a forma diferenciada e inovadora por meio da qual ela erigiu o
enredo do seu thriller.
Naturalmente, um thriller é inciado a partir
da exposição de um problema que deverá ser resolvido, com ou sem sucesso, no
final da história. O desejo de saber o desfecho da narrativa é o que move o
leitor a prosseguir com a leitura até o seu final. Em “Canção de Ninar”, outra
estratégia foi utilizada.
Leïla já inicia a sua narrativa com um a narração de um evento extremamente impactante, em que crianças morrem. O interesse que
ela desperta no leitor não é o de saber o que irá ocorrer no desfecho, o que já
é informado nas primeiras páginas, mas as circunstâncias que levaram a sua
ocorrência.
Em um thriller, costuma-se ansiar por grandes
reviravoltas, as quais conduzem habitualmente a um desfecho
inesperado. Essas reviravoltas geralmente possuem como parte de suas funções a
de participar da estruturação do enredo e a de surpreender o leitor, trazendo o fator surpresa como um estímulo para que ele prossiga com a leitura.
Em “Canção de Ninar” é diferente. Devido
ao fato de o desfecho já haver sido revelado no início, é natural que não haja
grandes reviravoltas em seu enredo. Mas a ausência de reviravoltas tornou a
leitura do livro desinteressante? Quem se aventurar na leitura da obra com essa
expectativa pode acabar se surpreendendo positivamente.
Após ser contratada, Louise desempenhou a função de babá muito bem. Rapidamente conquistou a afeição de Mila e Adam, e, apesar representar um grande peso para o orçamento da família, mostrou-se uma funcionária extremamente eficiente, o que podemos constatar a partir do seguinte trecho da obra:
“ As coisas inúteis desapareceram. Com ela, nada mais se acumula, nem a louça, nem as roupas sujas, nem os envelopes que esquecemos de abrir e que encontramos um dia abaixo de uma entrevista velha. Nada apodrece, nada desaparece da validade. Louise não negligencia nada. Louise é escrupulosa. Ela anota tudo em um caderninho com a capa florida. Os horários da dança, das saídas da escola, as consultas com o pediatra. Copia os nomes dos medicamentos que as crianças tomam, o preço do sorvete que comprou no carrossel e a frase exata que a professora de Mila falou.” (SLIMANI, 2016, p.29)
Na cozinha, Louise
é descrita como impecável. Sua relação com Mila era ótima. Quando não estava no
lar de Paul e Myriam, fazia grande falta. Não emitia qualquer indício de
psicopatia para cometer o crime narrado no início da história.
Que circunstâncias
motivaram uma pessoa tão virtuosa a cometer aquele crime? Esse é o fio que
conduz o leitor à conclusão da leitura do livro. Além do convívio de Louise com
a família de Myriam, Leïla também narra cenas da vida de Louise no lar de outra
família, o que permite uma melhor compreensão da formação de sua personalidade.
As curiosidade do
leitor a respeito das circunstâncias que levaram ao incidente narrado no início da
história é o que dispensa o emprego de recursos comumente utilizados para
mantê-lo interessado no curso do enredo. E é esse um dos principais
fatores que tornam a obra em uma singularidade para o gênero thriller.
Outro fator é o da
abordagem no enredo de problemas sociais raramente abordados por outros livros do gênero. Comecemos pela questão da
imigração na França. Leïla Slimani é uma franco-marroquina. Como se sabe,
Marrocos foi palco de disputas Imperialistas desde o final do século XIX. Acabou se tornando um ponto de saída importante imigrantes africanos que
desejam chegar à Europa. Atualmente, tem a sua autonomia respeitada pela
França.
Leïla Slimani é uma embaixadora francesa, o que pode justificar o fato de o contexto dos movimentos migratórios em direção à França haver influenciado a concepção de “Canção de Ninar”. Essa influência é vista a partir do momento em que a obra problematiza movimentos migratórios no território francês, estando subjacentes a esse tema diversos outros que a obra aborda, a exemplo de relações de poder e do convívio entre pessoas de diferentes classes.
Problemas desencadeados pelos movimentos
migratórios são atuais, mas a sua gênese é mais antiga. Após o término da
Segunda Guerra Mundial, a imigração passou a ser vista na França como uma
solução para dois problemas que assolavam o país: o déficit demográfico e a
carência de mão-de-obra. A imigração precisava de uma política regulamentatória
para ser implementada.
Havia discussões a
respeito de qual seria a melhor política para regulamentar a imigração. De um
lado, havia os economistas preocupados com a questão da mão-de-obra, e do outro
havia os demógrafos preocupados com o déficit demográfico. Os demógrafos eram
encabeçados por George Mauco e defendiam a imigração de famílias obedecendo a
critérios de compatibilidade étnica e cultural da França.
Contudo, o contexto pós-guerra impôs pressões
econômicas e imprimiu um viés de impopularidade a medidas de discriminação
social na França, o que determinou a prevalência da visão dos economistas.
Nesse contexto, entre 1945 e 1973 ocorreu uma imigração de centenas de milhares
de pessoas à França, os quais provinham, em sua maioria, de Portugal e da
Argélia.
Tempos depois,
começaram a surgir problemas: revoltas estudantis passaram a incluir a questão
da imigração em suas pautas e críticas às condições de vida dos imigrantes
vieram à luz. Em 1964, a França suspendeu o direito dos argelinos à livre
circulação no país e passou a negociar com a Argélia a redução da vinda de
imigrantes do país ao território francês.
Na década de 1970,
trabalhadores estrangeiros marcaram presença nos movimentos operários e greves
sociais, o que contribuiu para a visibilidade política dos imigrantes. Nesse
cenário, ocorreu a emergência da solidariedade aos imigrantes e a dos próprios
imigrantes na cena política.
Ao mesmo tempo, porém, leis que restringiam a
imigração ao território francês foram sendo implementadas em um contexto de
crise econômica. Ainda sob esse contexto, 32 argelinos foram mortos na França,
o que levou a Argélia a suspender movimentos migratórios em direção a sua
antiga metrópole. Diante dessa situação, em 1974 a França pôs fim à política de
atração de mão-de-obra imigrante.
Ao longo da década
de 1970 os governos franceses buscaram atingir a neutralidade da imigração, mas
nos governos que sucederam esse período houve um esbarramento desse objetivo
com a legislação francesa de direitos humanos. Sob essas condições, o poder
Executivo francês foi defrontado por uma forte resistência dos imigrantes e dos
seus descendentes, que cada vez mais organizados e mobilizados, lutavam por
desfrutar dos mesmos direitos que os demais habitantes da França.
A partir de então,
passou a haver um confronto político entre aqueles que desejavam a concessão de
cidadania e dignidade humana aos imigrantes e aqueles que se opunham a isso,
geralmente imbuídos de valores xenófobos e racistas. Atualmente, a França vive
imersa em uma crise migratória de difícil controle. Sabendo disso, o presidente
francês Emmanuel Macron, durante a própria campanha eleitoral, se comprometeu a
pôr em prática o humanitarismo em relação à imigração no território francês.
Diferente de seus predecessores no cargo de
presidente da República, Macron incentivou migrantes a se dirigirem a França.
Mais do que isso: buscou ofertar boas condições de vida aos imigrantes,
empenhando-se em garanti-los cidadania e dignidade humana. Isso contrasta com o
que se viu durante a maior parte da segunda metade do século XX, em que
diversas autoridades públicas restringiram movimentos migratórios sob a
influência de pensamentos xenófobos e racistas.
Conhecer o contexto dos movimentos
migratórios é fundamental para compreender diversas reflexões que Leïla Slimani
insere em “Canção de Ninar”. Aqui contemplamos cenas em que a xenofobia e o
racismo impregnados durante décadas na França mostram a sua influência sobre a confiança que um
cidadão francês tem ao contratar um imigrante para cuidar de seus filhos.
Também é à luz desse contexto que podemos compreender a necessidade que impeliu
Leïla a ilustrar o convívio de partes nobres e desvalorizadas de um mesmo país,
contribuindo para a naturalização do convívio humano diante de diferenças
sociais e culturais.
Ainda sob esse contexto, Leïla retrata o
convívio de pessoas de diferentes classes tanto a partir do momento em que
Louise fora admitida ao emprego de babá no lar de Myriam e Paul quanto no período em que trabalhou em outro lar.
Leïla também buscou retratar as relações de poder em que está imerso o convívio
entre pessoas de diferentes classes, as quais podem ou não oprimir uns e
favorecer outros a depender do caráter das pessoas envolvidas nessa relações.
Esses não são os
únicos problemas sociais descortinados por “Canção de Ninar”. Na obra, Myriam
enfrenta um dilema que se apresenta à mulher do mundo contemporâneo: como
ser uma boa mãe e, ao mesmo tempo, prosperar no mercado de trabalho?
Atualmente, mulheres trabalham, escrevem, têm
a possibilidade de liderar a própria família e assumem cargos no poder que
durante muito tempo eram ocupados exclusivamente por homens, a exemplo da presidência da República. Contudo, nem sempre foi assim e mulheres que
mostravam ambição e tinham como projeto de vida desempenhar funções que
estivessem além da de serem boas mães e boas esposas eram vistas como fúteis e
malevolentes.
Em “Emílio, ou Da
Educação”, Jean Jacques Rousseau, um dos maiores expoentes da Filosofia no
século XIX, acabou reproduzindo a visão de família patriarcal. Ao olhar de
Rousseau, a mulher foi criada para agradar ao homem. Caso decidisse fugir
desse objetivo, acabaria trazendo a ruína entre os gêneros. Para que isso não
ocorresse, Rousseau defendeu a visão de que desde a tenra idade as mulheres deveriam
ter pouca liberdade e aprenderem a serem mães e esposas.
Apesar de não criticar a desigualdade entre os gêneros e nem denunciar os infortúnios da mulher em sua condição de
secundariedade social e política, além de acabar reproduzindo a visão de vida
patriarcal, Rousseau foi o filósofo de sua época que mais contribuiu para o
movimento feminista nos séculos XIX e XX. Contudo, a pouca preocupação de
Rousseau com a passividade social e política a que as mulheres estavam
condenadas, à sua época, não deixou de ser extremamente prejudicial.
Nesse contexto,
Elisabeth Badinter, historiadora francesa, analisou o fato de durante os
séculos XVII a XIX a mulher erudita ser constantemente ridicularizada e o de tudo
se fazer para ela não existir. Em “Um Amor Conquistado: O Mito do Amor
Materno”, Elisabeth Badinter analisa, à luz da construção histórica do papel
social da mulher, discussões a respeito de como a mulher conseguiria conciliar o
seu papel de mãe com a carreira profissional a partir da concessão de direitos.
Na obra mencionada do parágrafo anterior, há
um capítulo, intitulado “ A greve dos ventres”, no qual Badinter fala sobre
como a construção do ideal materno se choca violentamente contra as exigências
do mercado de trabalho. Nas décadas de 1970 e 1980, lutas sociais que visavam
garantir a autonomia e a emancipação da mulher auxiliaram a
conquista de direitos que lhes permitiram trabalhar e serem mães concomitantemente.
Na Suíça, para
atingir a conquista desses direitos, havia reivindicações a respeito das condições de igualdade profissional entre os sexos, de forma a permitir às
mulheres conciliar a maternidade com a carreira profissional. Na terceira parte de “Um Amor
Conquistado: O Mito do Amor Materno”, Badinter também fala a respeito da
diversidade das aspirações femininas, as quais poderiam incluir ou não a
vivência da maternidade.
Apesar de haver
muitas discussões e movimentos sociais com vistas a garantir direitos
femininos, muitos resquícios do machismo ainda pairam sobre a sociedade, os
quais estão enraizados na mente dos cidadãos, incluindo as mulheres. Isso
explica por que em “Canção de Ninar” Myriam, embora deseje obter sucesso na
carreira do Direito, ainda tenha o sentimento de culpa por dividir os cuidados
de seus filhos com uma babá.
Apesar de que 'Canção de Ninar” seja um livro com menos de 200 páginas, tudo é contado nos mínimos detalhes. Lendo-o com bastante atenção, não encontrei pontas soltas e todos os pontos são bem desenvolvidos. O aspecto psicológico da obra é bastante importante para a construção do seu enredo.
Os personagens são muito bem desenvolvidos e
possuem a sua mentalidade bem explanada. Conforme já mencionei, o que move o
leitor a prosseguir com a leitura da obra é a curiosidade a respeito das
circunstâncias que motivaram uma mulher extremamente competente em seus
afazeres e sem inclinações para ser psicopata a cometer um crime tão grave.
Na maioria das vezes, spoilers acabam
comprometendo os momentos de lazer que uma história propicia. Em “Canção de
Ninar”, isso não ocorre: aqui o que interessa não são os acontecimentos
principais em si, mas as circunstâncias em que eles sobrevém.
O enredo também
problematiza a banalização do mal e a culpa. À medida que a vida de Louisae antes de chegar ao lar de Myriam e Paul é retratada, podemos compreender o modo
como a sua personalidade foi moldada e os principais aspectos psicológicos
envolvidos no crime que cometeu contra os filhos do casal.
O final da obra é
previsível e pode não acrescentar muito ao leitor. Contudo, o desenvolvimento é
muito bem construído e é capaz de suprir a falta de um desfecho arrebatador.
Indico “Canção de
Ninar” a leitores de todas as idades. A
sua narrativa é inovadora tanto do ponto de vista estrutural, uma vez que adota
uma estrutura pouco comum para o gênero thriller, quanto político, inserindo
discussões sobre problemas pouco levantadas por outros livros do gênero. A
linguagem da narrativa é leve, mas não deixa de problematizar diversos aspectos
da vida em sociedade. A obra representou para mim uma grande oportunidade de
aprendizagem, e acredito que também tenha sido extremamente importante para
Leïla Slimani, que venceu o prêmio Goncourt, extremamente relevante para a
Literatura e para a França.
Autor da resenha crítica: Felipe Germano Monteiro Leite
Ficha técnica:
Título: Canção de NinarAutor(a): Leïla Slimani
Tradutor: Sandra M. Stroparo
Editora: Tusquets
Número de Páginas: 192
Ano de Publicação: 2018
Nota: 10/10
Parabéns pela resenha! Gosto muito da tua forma de escrita.
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