[Resenha] Prodigy - Marie Lu

 



Sinopse: Os opostos perto do caos. Depois que um cataclismo atingiu o planeta Terra, extinguindo continentes inteiros, os Estados Unidos se dividiram em duas nações em guerra: a República da América, a oeste, e as Colônias, formadas pelo que restou da costa leste da América do Norte. June e Day, a menina prodígio e o criminoso mais procurado da República, já estiveram em lados opostos uma vez.

Agora eles têm a oportunidade de lutar lado a lado contra o controle e a tirania da República e, assim, alterar para sempre o rumo da guerra entre as duas nações. Resta saber se estão preparados para pagar o preço que as transformações exigirão deles.


Opinião: "Prodigy"


Lançado em 2011 por Marie Lu, escritora chinesa radicada nos Estados Unidos, “Legend" foi mais uma distopia norte-americana a obter um grande sucesso comercial e conquistar uma grande legião de fãs. Tendo posteriormente dado origem a uma série com quatro livros, a distopia chegou ao Brasil em 2014 publicada pela editora Rocco. Desde então, surgiram várias resenhas a respeito, cujos comentários quase sempre elogiosos deixaram em mim uma grande curiosidade por conhecê-la. Nesta resenha, falarei sobre “Prodigy”, o segundo livro da série.


Se você conhece o blog há pouco, ou essa é a sua primeira visita a nós, provavelmente não terá lido a resenha de "Legend". Basta que você clique para ter acesso. Caso não tenha lido a primeira obra da série, é possível que o prosseguimento da leitura dessa postagem acabe trazendo revelações indesejadas do enredo. Afinal, “Legend" teve um desfecho bem inesperado que eu acredito que vocês irão preferir conferir na própria obra. 


Dado o aviso, começarei a falar sobre o enredo de “Prodigy”. Após deixar no livro anterior diversos ganchos para a sua continuação, grandes reviravoltas e um final de tirar o fôlego, Marie Lu torna a nos contar na obra aqui resenhada como Day e June se encontravam após aqueles acontecimentos. 


Tal como no primeiro livro da série, “Prodigy” também possui o seu enredo dividido em dois focos narrativos. June dá início à história. Em movimento, ela nos conta sobre como se encontrava após as reviravoltas ocorridas em “Legend"e a sua união com Day. Ela guardava um grande rancor pela morte de Metias, e com grande razão.


Também sentia uma enorme falta de Ollie, o seu cachorro. A sua realidade enquanto prodígio da República naquele momento era um passado. Naquele presente, ela agora era uma procurada pela República, a qual oferecia uma grande recompensa a quem a encontrasse. Ficamos sabendo que o primeiro Eleitor da República faleceu, e que Anden Stavropoulos assumiria o lugar.


Em seguida, é a vez de Day nos contar sobre como ele se encontrava diante daquela situação. Ainda em movimento, ele fala um pouco sobre o que pensava sobre a morte do primeiro Eleitor. Eles chegam a uma residência e nela passam um tempo até que chegam a um dos maiores quartéis de Las Vegas e nele ficam por um tempo. 


Visto pela República como um grande criminoso, pelo povo Day era considerado uma espécie de herói. Enquanto June nutria uma grande desconfiança pelos Patriotas, um grupo rebelde desse mundo distópico, Day depositava neles uma grande confiança e, de certa forma, tentava incutir em June o mesmo pensamento.


Convivendo com Day e outras pessoas que participavam do cotidiano do adolescente, June concorda com o plano de assassinar o novo Eleitor. Até quando ela concordaria com o plano? Ela e Day continuam a se revezar enquanto narradores da história. 


Em “Legend”, Day e June pertenciam a setores distintos da sociedade e futuramente se uniram com um objetivo em comum. Em “Prodigy”, após aquela união, os adolescentes se separam novamente. Afirmo uma coisa com grande segurança: se em “Legend" o cenário político da história é repleto de mistérios, em “Prodigy” isso não é muito diferente. 


E isso muito se deve ao fato de Marie Lu não fornecer grandes detalhes sobre os acontecimentos que estão além do campo de visão dos protagonistas. A autora trabalha bem o ponto da desconfiança de June em relação aos patriotas, contudo. E desenvolve muito bem Anden, o novo primeiro Eleitor.

Devido a uma especulação de que ele queria June como a nova Primeira Cidadã, ela vai a sua procura. Anden era amado pelo antigo primeiro Eleitor, e sua mãe foi a última Primeira Cidadã. Esqueci de dizer: a Primeira Cidadã era uma espécie de líder do Senado. Será que essas coisas seriam apenas mera coincidência? Eu prossegui a leitura da obra com essa dúvida em mente. 


Outra especulação era a de que o novo Eleitor estava apaixonado por June. Como Day reagiu a isso? Ficamos sabendo que ele nutria esse mesmo sentimento por June, e lhe confessa isso. A adolescente, por outro lado, ela não tem certeza quanto aos seus sentimentos em relação a Day. Um cenário perfeito para um triângulo amoroso. 


O plano de trazer ruína a Anden até o momento continua de pé. Enquanto Day, Kaede e Tess empreenderiam uma viajem, June ficaria encarregada de conduzir o novo Eleitor ao assassinato por eles planejado. Repito uma pergunta que já fiz nesta resenha: será que esse plano dará certo? É melhor conferir a questão no próprio livro. 


Qual seria o objetivo de matar Anden? Posteriormente realizar uma revolução que modificaria definitivamente a situação do país. Day e June se separam. Durante a viajem, Day tinha como objetivo resgatar Éden, o seu irmão caçula. June, por sua vez, volta a conviver com pessoas da República, na qual antes ela era vista como uma grande heroína. 


Ainda em “Legend”, entendemos os motivos para que ela se voltasse contra a República. O assassinato de Metias foi algo que deixou claro aquela necessidade. E o avançar do enredo de ˜Prodigy” traz uma série de explicações surpreendentes a respeito. 





Conforme eu disse na resenha de “Legend”, é uma característica em comum às distopias uma criticidade de viés anti-autoritário com vistas a denunciar os revezes que a perpetuação de determinadas circunstâncias do presente poderiam suscitar caso não modificadas. Em “Prodigy”, temos a oportunidade de conhecer melhor o mundo além dos Estados Unidos nesse universo distópico. 


Nele, a potência não possuía a mesma hegemonia que possui hoje. A título de exemplificação, a África, que hoje é o continente mais pobre do planeta, possuía grandes potências econômicas. E a Antártida, hoje inabitada, abrigava grandes civilizações. Naquele contexto, os Estados Unidos não representavam mais a maior economia do mundo.


Situação bastante similar era a do referido país antes da Segunda Guerra Mundial, momento a partir do qual diversos países da Europa enfraqueceram e os Estados Unidos puderam emergir como a maior potência mundial. E, especialmente, à de como ele se encontrava antes da Guerra de Secessão. 


Naquele período, os Estados Unidos estavam em divididos entre União e Confederados. Já na distopia aqui resenhada, entre República e colônias. 

Naquela época, havia grandes discrepâncias entre Norte e Sul do ponto de vista econômico. Enquanto o Norte era industrializado e defensor de uma mão-de-obra assalariada, o Sul possuía uma economia agrícola voltada às exportações tendo o suporte de uma mão-de-obra escrava.


Possuindo um clima temperado, o Norte dos Estados Unidos foi propício a uma ocupação com o objetivo de povoamento. Após a Independência dos Estados Unidos, a industrialização incipiente do país o levava a continuar importando manufaturas da Inglaterra, situação que se manteve mesmo após os embargos econômicos impostos por Napoleão Bonaparte e o seu Bloqueio Continental.

Antes, a economia do Norte do país possuía como base a agricultura familiar, contrastando com o Sul, cuja economia era baseada nas Plantations e utilizava a mão-de-obra escrava. Um dos principais produtos do Sul era o algodão, cujas exportações para a Inglaterra concorriam com a produção da Índia, Egito e Brasil. A mão-de-obra familiar no campo e assalariada nas cidades do Norte permitiram o desenvolvimento de sua manufatura e burguesia, fatores que, inclusive, contribuíram para a independência do país.


A mão-de-obra livre e o desenvolvimento das manufaturas permitiram a formação de um mercado interno na própria região, fato que permitiu o surgimento de um intenso comércio. Isso era todo o necessário para o surgimento da indústria na região. Com o advento de máquinas, o Norte adquiriu uma grande produtividade e a sua industrialização adquiriu maior velocidade. Estimava-se que em 1860 a produtividade de um estadunidense equivalia a de 3000 indianos. Com o desenvolvimento da Indústria, o Norte do país passou a atrair mais imigrantes europeus. 


Naquele mesmo cenário, os Estados Unidos vivenciavam uma grande expansão territorial. Falarei mais a respeito posteriormente. Nesse processo de expansão, momento no qual o Norte do país crescia massivamente e a sua importância era cada vez maior, havia dissidências quanto à manutenção da mão-de-obra escrava. Além de outros fatores, essas divergências levaram a separação do Norte e o Sul do país em União e Confederados. 


Embora a autora não forneça explicações a meu ver satisfatórias sobre a divisão do país em sua série, é difícil não perceber as similaridades entre aquela divisão dos Estados Unidos naquele momento em muito lembra a sua divisão na distopia aqui resenhada em República e colônias. Uma característica em comum bastante marcante é que finda a Guerra de Secessão, o Norte do país passou a ser visto como uma espécie de potência invasora para o Sul, mesma forma como as colônias viam a República nos livros de Marie Lu. 


Nos dias que correm, a África encontra-se em uma realidade muito distante da de ameaçar a hegemonia econômica e política dos Estados Unidos. Muito pelo contrário. Ainda hoje, o continente é o que oferece as piores condições de vida para os seus habitantes. Seu PIB corresponde a apenas 1% do mundial. É uma realidade compreensível ao se levar em consideração a exploração que o continente sofreu das potências europeias ao longo dos últimos séculos.


Atualmente, a Antártida é um continente inabitado. Suas primeiras expedições de povoamento datam do século XVIII. Em 1959, com a assinatura do Tratado Antártida, ficou acordado entre os países que o usufruto do continente deveria ter como propósito o bem-estar comum e hoje o continente abriga diversas bases científicas. Sendo coberto por 98% de gelo, ele não oferece condições para que os seres humanos o habitem como o fazem nos demais continentes.


Sua vegetação é pouco diversificada em virtude disso. Boa parte das mudanças climáticas vivenciadas pela Terra são estudadas mediante estudos realizados no próprio continente. Mas há teorias de que as mudanças climáticas que hoje vivenciamos poderia ter como resultado o seu povoamento. 


No contexto da Guerra de Secessão, Abraham Lincoln ascendeu ao poder nos Estados Unidos. Ele tinha como propósito unir a nação, ainda que a chegada a esse estado dependesse da violência resultante da guerra. Analogamente, Anden Stavropoulos emerge na cena política de “Prodigy" exercendo uma grande influência e prometendo trazer paz ao país, não descartando o emprego da violência para concretizar esse fim.





Se lembram de quando eu mencionei o fato de dos sentimentos daquele personagem em tudo contribuir para o surgimento de um triângulo amoroso ao longo do enredo? Hipótese descartada. Em seu foco narrativo, Day acaba tomando ciência de que Tess nutria profundos sentimentos por ele. 


Na resenha de “Legend”, expliquei por que a obra requer tão pouco tempo para ser lida ao elencar alguns recursos utilizados pela autora na construção de uma narrativa eletrizante. Em “Prodigy”, vemos uma redução na velocidade do ritmo da narrativa. Na obra, Day e June se encontram com um humor mais irritável.


Nesse aspecto, eles me lembraram bastante de “Harry Potter e a Ordem da Fênix”. A autora fez questão de retratar o humor irritável do protagonista naquele específico volume da série. Isso foi bom ou ruim? Em ambos os casos, aquilo contribuiu para a construção da carga dramática das obras. 


Eu particularmente gostei bastante disso, e considero que esse aspecto de “Prodigy" também tenha dado contribuições para que o menor dinamismo da obra fosse compensado a ponto de fazê-la ser considerada por mim como superior ao volume anterior da série. 


Se lembram de quando em mencionei a falta de sal dos personagens? A irritabilidade do humor também colaborou com a dissolução daquela minha impressão de “Legend”. Também cheguei a mencionar o fato das personalidades de Day e June serem bem parecidas no primeiro volume. No segundo, ambos vivenciam acontecimentos que nos permite enxergar melhor as diferenças de personalidade. 


Um traço da obra que muito atraiu a minha atenção foi a exposição das fraquezas de Day. Fugitivo, em “Legend" Marie Lu nos mostrou o personagem como uma pessoa extremamente forte e pouco vulnerável. Em ˜Prodigy˜, temos a oportunidade de conhecer melhor as suas fragilidades. 


No livro aqui resenhado, a autora também falou mais sobre o passado do personagem, o qual no livro anterior era repleto de mistérios. Nem todos esses mistérios sobre o personagem são esclarecidos nesta obra. Tanto sobre ele quanto sobre o universo distópico. 


Já cheguei a mencionar o fato de que o enredo não traz grandes revelações sobre como são as coisas além dos campos de visão de Day e de June. E esse é um dos principais fatores que tornam essa série tão repleta de mistérios. Um deles está na tão mencionada Praga. 


Em muito a sua aparição lembra guerras biológicas. O problema adquiriu maior visibilidade no século XX, mas as suas origens remontam a uma época bem longínqua. Há registros, por exemplo, de que os homens de Neanderthal punham fezes em suas flechas para elevar o seu poder letal. 


Esses são os casos mais antigos de guerra biológica que se tem registro. A ele atribuímos o conceito de usar microrganismos como arma com vistas a ceifar vidas de seres humanos, outros animais ou plantas. Em se tratando de operações militares, o caso mais antigo que se tem registro data do século VI a.C e foi cometido pelos assírios em uma tentativa de contaminar indivíduos de um outro povo. 


Contudo, estudos afirmam que o primeiro ataque biológico deliberado data do século XV a.C, momento no qual ocorreu o uso contra o próprio faraó do Egito. Durante a Idade Média, ocorreu o uso de corpos em decomposição para contaminar o abastecimento de água de uma cidade sitiada. Um caso bastante conhecido daquele período histórico data de  1346, quando os tártaros lançaram vários cadáveres na cidade de Kafka, nela provocando uma grande epidemia. O resultado daquele atentado foi a rendição da cidade e uma posterior migração de seus habitantes para a Europa. Acredita-se que essa migração tenha sido um dos fatores para a disseminação da peste negra no continente. 


Com o início do desbravamento do continente americano por parte das potências europeias, ocorreu a transmissão de diversas doenças à população ameríndia. Não tendo ela sido exposta a essas novas enfermidades, decorreu disso um grande genocídio. Estima-se que, de uma população original de 56 milhões de aborígenes, 95% veio a óbito em virtude disso.


Há uma diferença entre a transmissão natural de uma doença e a sua transmissão com o propósito de promover uma guerra biológica. As Américas não foram poupadas delas. E, no século XV, Francisco Pizarro devastou o império Inca com a varíola. Já em 1757, foi a vez de um exército britânico dizimar uma população indígena em torno de Fort Pitt.


Aquela poderosa arma também foi utilizada no processo de independência dos Estados Unidos. A Rússia também dela se valeu contra a Suécia. Nas duas grandes guerras mundiais, também foi possível verificar o seu uso. A AIDS também possui um caso a ser analisado.


Tornando-se em um grande problema de saúde pública décadas atrás, o vírus da doença possui uma origem mais remota. Primos do vírus já existem há centenas de milhares de anos e parasitam animais como os felinos, causando-lhes leucemia, e os marsupiais. Acredita-se que o processo que deu origem aos animais placentários seja resultado da interação do genoma dos que não possuem placenta com o de alguns retrovírus.


Como eles chegaram a nós? Acredita-se que pela interação entre a nossa espécie com macacos na África. Também há a teoria de que o vírus causador da AIDS tenha sido fruto da interação entre os grupos de HIV provenientes da África com o de micoplasmas resistentes selecionadas pela ação dos antibióticos. 


O progresso da ciência permitiu aos homens debelar a varíola. Contudo, ele também ensejou condições que impulsionaram a difusão da AIDS. Algumas de suas invenções permitiram um maior contato entre o sangue dos seres humanos. Embora isso seja fundamental para a cura ou abrandamento de algumas enfermidades, esse contato é uma das portas de entrada para a infecção pelo HIV.


A partir da década de 1950, ocorreu um aumento nas transfusões sanguíneas, fator que futuramente contribuiria para a disseminação do vírus. A ampliação do uso de drogas intravenosas, especialmente após o advento da antibioticoterapia no século XX, permitiu a vitória da humanidade contra diversas doenças, mas a predispôs à contaminação pelo HIV. 


A hipótese de que a doença seja fruto da interação entre humanos e macacos ainda é incerta. Mas há um grande viés de preconceito em relação a isso. Inclusive, há teorias de que a AIDS chegou a nós seres humanos por meio de relações sexuais entre macacos e algumas tribos africanas. Também há defesas de que a sua disseminação entre os seres humanos tenha sido impulsionada pela promiscuidade nas relações homossexuais, mas hoje se sabe que essa promiscuidade não é algo exclusivo ou sequer próprio dessa prática sexual.


Na obra “O Livro Negro da Condição das Mulheres”, escrita por diversos autores, o uso do estupro como uma arma de guerra é apontado no terceiro capítulo de sua primeira parte. Nele, há uma análise segundo a qual a AIDS foi utilizada como uma arma biológica ao ter como veículo o estupro. 


Após o atentado às torres gêmeas em 11 de setembro de 2001, surge o conceito de bioterrorismo. Ele aludiu a diversos eventos históricos nos quais microrganismos foram empregados como armas biológicas para promover uma destruição humana em massa. Na série  cuja obra aqui resenhada pertence, a Praga a que eu me referi foi diversas vezes mencionada e a sua associação com o contexto político também.


Contudo, assim como em relação a outros pontos, essa associação também é repleta de mistérios, os quais não foram completamente resolvidos na presente obra. Nos primeiros capítulos da obra, vimos como os portadores da Praga eram malvistos pela sociedade. Sobre esse ponto, a obra termina com grandes surpresas após, em um de seus últimos capítulos, nos revelar que um personagem bastante importante para o enredo ser contaminado pela referida Praga. E isso nos deixa com a ânsia por ler o próximo volume em busca de explicações sobre aquela associação. 


O tema trazido pela autora é obsoleto? A meu ver, definitivamente não. Diversos acontecimentos históricos nos quais se verifica o bioterrorismo ocorreram há um intervalo de tempo desprezível em comparação com a extensão da História da humanidade. Além disso, no ano passado o site Zero Hedge trouxe a especulação que a pandemia do coronavírus que atualmente vivenciamos seja uma arma 

biológica proveniente dos laboratórios chineses. 


E no avançar do enredo a autora nos conta sobre a criação de armas biológicas nos laboratórios desse mundo distópico. Inclusive, elas vinham sendo utilizadas em crianças com uma extrema crueza. Ainda no enredo, vimos a Praga promovendo uma grande quarentena em Los Angeles, situação bastante similar a que vivemos atualmente. 




Ao longo desta resenha, cheguei a comentar sobre como Day foi melhor desenvolvido na obra aqui resenhada. Agora, falarei sobre o que é possível aprender de novo sobre June. Eu também já comentei sobre o fato dela ser a queridinha da República antes de diversos revezes lhe atingirem em cheio e ela se ver na contingência de se unir a Day. 


Seria de se estranhar ver a protagonista aceitar a mudança de status de prodígio da nação para o de criminosa. Marie Lu expõe todas as repercussões psicológicas que isso trouxe a June, e mais: explica como ela conseguiu a sua redenção perante a República. A autora também aproveita para explicar os motivos a respeito de a adolescente se voltar contra a República, como foi o caso do assassinato de Metias. 


Estejam certos de uma coisa: as explicações para o assassinato do irmão de June fornecidas no livro anterior demonstraram serem insatisfatórias após eu concluir a leitura da obra aqui resenhada. E mais explicações são fornecidas em ˜Prodigy˜. A princípio, June transmitia-me a impressão de sentir algum desconforto após abandonar o lar que a República lhe representava para viver aventuras com Day. 


E no presente volume ela tem a oportunidade de retornar ao convívio com a República. Com o avançar da narrativa, Marie Lu expõe motivos por que a protagonista deveria nutrir ódio por Anden e, em função disso, cumprir o plano proposto antes dela se separar de Day. Preparem-se para descobertas surpreendentes sobre esse ponto desenvolvido na obra. 


E o relacionamento com Anden, será que ele estaria tão distante de ser concretizado? Leiam para saber no que isso foi dar. E será mesmo que June conquistou a sua redenção? Ao concluir a sua leitura, fiquei com um grande pressentimento de que virão mais descobertas surpreendentes nos volumes seguintes da série. 


Enquanto June tinha o coração de Anden, Day tinha o de Tess. Ela, por sua vez, a todo momento lançava mão de tentativas para envenenar a mente de Day contra June. Marie Lu afirma que isso decorre do fato dela não ter o conhecimento de diversas atitudes positivas cometidas por June, e nem sobre diversos boatos a seu respeito serem falsos. Contudo, a atmosfera de mistério dessa história criou uma certa desconfiança de minha parte sobre esse ponto. 


E a busca de Day por Éden? A autora lança mão de fluxos de memória para ilustrar o passado de Day, o que teve o efeito de criar um vínculo de empatia entre o leitor e a realização daquele objetivo do protagonista. Mais do que isso: ele nos permitiu conhecer as fraquezas do protagonista.


Ao longo de todo o enredo, Marie Lu as expõe, lançando-lhes o desafio de conseguir

supera-las para a obtenção de êxito na concretização daquele

 objetivo. Além de expor as fraquezas dos protagonistas, a autora também o fez em relação a um ponto que não trabalhou no livro anterior da série. Nele, os personagens possuíam como uma marca bem evidente o egoísmo.


Em “Prodigy”, Marie Lu aborda o lado altruísta dos protagonistas. Especialmente no caso de Day, o qual em um momento do enredo encontra um garoto em condições bastante semelhantes às de seu irmão Éden. 


Tanto Day quanto June tinham como objetivo se mudarem para as colônias. A autora não explica como era a vida nelas, mas os referidos adolescentes acreditavam que ela fosse bem melhor à vivida na República. Em determinado momento da obra, a autora dá a entender que as colônias fossem uma terra de liberdade e muitas oportunidades. 


Movida por interesses bastante similares, ocorreu a Marcha para o Oeste nos Estados Unidos. À época, enquanto o Norte do país se desenvolvia, havia uma procura por novas terras, localizadas ao oeste. Influenciados pela doutrina do Destino Manifesto, a marcha para o Oeste ganhou grande impulso. A título de curiosidade, a referida doutrina também foi utilizada como justificativa pelo país para levar a democracia a países no ultramar, a exemplo de antigas ilhas do Caribe e de países da América Central. 


No Brasil, ocorreu algo bastante semelhante. Inclusive, o nosso país não teria as dimensões territoriais que hoje possui sem que tenha havido uma expansão rumo ao oeste por meio de violações ao Tratado de Tordesilhas. Em 1640, ele foi anulado. 


Devido à referida expansão, novos tratados foram firmados entre Portugal e Espanha. Em 1713, a ocupação da colônia de sacramento por parte de Portugal foi reconhecida pela Espanha mediante a assinatura do tratado de Utretch. Em 1750, foi assinado o tratado de Madri, o qual pôs fim às regras impostas pelo Tratado de Tordesilhas. 


O referido tratado pôs em vigor o utis possidetis, princípio segundo o qual a posse de um território seria justificada pela sua ocupação. As disputas territoriais entre Portugal e Espanha resultaram em guerras que levaram à assinatura de novos contratos. Elas tiveram fim com a assinatura do Tratado de Badajós em 1801. 


Na ditadura varguista denominada Estado Novo, houve o empreendimento de grandes esforços para uma efetiva ocupação da Amazônia, de regiões deprimidas do Nordeste e da região Centro-Oeste. 


Em meio ao processo de ocupação de novos territórios, as atividades econômicas brasileiras foram se diversificando. O Nordeste, que durante a maior parte da História foi a região mais rica do Brasil, perdeu a sua hegemonia econômica para o Centro-Sul do país. Sendo o maior polo industrial do país, São Paulo atraiu uma migração massiva oriunda do Nordeste entre as décadas de 1930 e 1950.


Já entre as décadas de 1970 e 1980, ocorreu um grande impulso desses movimentos migratórios rumo à região Norte do país. Tudo isso em busca de melhores condições de vida. De maneira similar, na série aqui resenhada June e Day desejam migrar da República para as colônias em busca de um ambiente político menos hostil.


Contudo, embora Marie Lu tenha ilustrado a perspectiva daqueles personagens em relação a como era a vida nas colônias, ela não mostrou como ela realmente era no volume da série aqui resenhado. Assim mesmo, ela apontou vários motivos pelos quais ambos não deveriam ter qualquer tipo de apreço pela República. 


Isso é muito bem exposto na obra.  Como um todo, ela aprofundou a apresentação do cenário político que ambienta a série.  Ele também fala mais a respeito de sua origem. A ela estão associadas as mudanças climáticas que a Terra sofreu. Em muitas trilogias, o segundo volume costuma representar uma espécie de ponte entre o primeiro e o terceiro livro.


Em “Prodigy”, foi possível enxergar isso. Contudo, apesar de haver menos ação e o ritmo ser menos veloz, a história não foi nada menos interessante. Muito pelo contrário, além de melhor desenvolver os personagens, as situações por eles vivenciadas foram bem mais marcantes. 


O suspense presente no livro aqui resenhado, diferente de seu antecessor na trilogia, foi construído à base daquelas situações, as quais por si só apreenderam a minha atenção sem que a autora precisasse lançar mão dos ganchos que empregou em “Legend”. Mais do que trazer uma história a meu bastante superior à de seu antecessor na trilogia, “Prodigy” fez a ponte entre o primeiro e o terceiro volumes com grande maestria. 





Se lembram dos romances em vias de florescer no início da história? Em “Prodigy' eles não representaram nada além de um pano de fundo para o enredo, o qual deixou várias pontas soltas a serem unidas no livro que o sucede. Embora Day tenha confessado a June os seus sentimentos em relação a ela, a mesma não deu provas de reciprocidade.


Para completar, enquanto ela tinha um futuro bastante promissor na República e um pretendente nas mesmas situações, teria sido compreensível enxergar um grande mal estar sentido por Day. Todavia, não foi possível detectar uma grande repercussão negativa disso em relação aos objetivos que ele se propôs a cumprir. 


Além disso, não era possível afirmar que ele fosse irrelevante. Ele era o fugitivo mais procurado pela República e o seu assassinato para ela ainda era um mistério. Além disso, June havia largado tudo para ficar com Day em “Legend”. E ao longo da história é possível notar que Day não tinha a sua indiferença. 


Com quem June iria ficar? Prefiro deixa-los com a vontade de descobrir lendo a história, mas a forma como essa decisão foi tomada deixa uma grande curiosidade para iniciar logo a leitura do próximos volumes da série. Outro mistério a ser resolvido no próximo volume da série está nas motivações pelas quais a República desejava conceder a oportunidade de redenção a June.


O livro fornece explicações a respeito, mas elas não foram satisfatórias para mim. Inclusive, não descarto a hipótese de que isso faça parte de um outro plano de República. Na obra, a sua lealdade à República é posta à prova.


Ao longo desta resenha, apontei o fato de Tess tentar manipular a opinião de Day contra June.  Apesar disso, não pude constatar nem um transtorno de caráter por parte da personagem. Além disso, ela forneceu motivos reais para Day se voltar contra a outra protagonista. E nisso vejo mais pontas soltas a serem unidas no próximo volume da série. 


Eu cheguei a comparar “Prodigy” a “Harry Potter e a Ordem da Fênix”. Outra semelhança entre as obras está em mostrar como os seus protagonistas reagem ao se encontrarem diante de uma mudança negativa na opinião pública a seu respeito. 


Na resenha de “Legend”, cheguei a afirmar que as semelhanças entre a trilogia aqui resenhada e a de “Divergente” eram bastante evidentes, e que isso produzia em mim a impressão de que a de Marie Lu fosse mais do mesmo. Um detalhe que eu não cheguei a mencionar foi o de que a publicação de ˜Legend” foi cronologicamente anterior à de “Divergente”. Contudo, o cenário que ambiente ambas as histórias é parecido demais, além de que há cenas cujas similaridades são gritantes. 


E isso por muito pouco impediu “Prodigy" de obter de mim um grau máximo de apreciação. A forma como os personagens amadureceram e as mudanças nos recursos que a autora empregou compensaram esse fato. Isso sem mencionar que a construção do enredo foi extremamente adequada para o segundo livro de uma trilogia. 


Cheguei a falar sobre a incerteza das condições de vida dos habitantes das colônias. Lá chegando, Day granjeia um grande prestígio. Embora muita coisa ocorra além do seu campo de visão e do de June, ele calculava que a Praga seria uma arma da República contra as colônias. Próximo ao fim, presenciamos uma situação que, com quase certeza, culminará com um entrelaçamento dos interesses individuais do protagonista com o de grupos políticos que participam do enredo.


Do meio para o fim, uma grande atmosfera de tensão é instaurada no enredo. Nele, houve uma situação na qual Day se encontrava em prostração ao ver as pessoas que deveria proteger em perigo. 


Já cheguei a mencionar o fato dessa obra trazer vários mistérios a serem resolvidos a respeito do cenário político. Vemos uma grande articulação política contra Anden nessa obra, a qual não teve um aprofundamento por parte da autora. Aqui temos mais um ponto a ser esclarecido no volume seguinte da série. Inclusive, por parte da própria República. 


A forma como esse livro termina é extremamente surpreendente. E é coerente na mesma proporção. Fechei o livro com um grande desejo de ler o próximo. Após concluir a leitura de “Legend”, tive a mesma ânsia pela leitura pelo seu sucessor, mas em “Prodigy” o enredo modificou completamente a minha concepção sobre a distopia de Marie Lu. A considero como uma das melhores que já li até o momento e a indico a todos os apreciadores do gênero. 


Autor da resenha: Felipe Germano Monteiro Leite



Prodigy (2013) | Ficha técnica:

Título original: Prodigy

Autora: Marie Lu

Número de páginas: 303

Nota: 10/10


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